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Um conflito que atravessa gerações

Grécia Antiga. Heródoto, Platão, Xenofonte e Ateneu descrevem, aos detalhes, aspectos ligados ao homossexualismo ateniense. A pederastia – relação sexual entre adultos e adolescentes – era uma prática “comum” na cidade-estado de Atenas. Jovens aprendizes, entre os 12 e 18 anos, submetiam-se a relações afetivas com seus tutores. Os filósofos atenienses viam na relação sexual com aprendizes uma forma de afinidade e de crescimento intelectual, o que representava uma realidade em ascensão em Atenas. Vista como exemplo de “democracia” no mundo antigo, a cidade-estado permitia aos seus cidadãos a livre opção pela sexualidade, mesclada com pequenos lampejos de organização social. O que os atenienses concebiam por “democracia” era, na prática, uma tipificação do que a sociedade contemporânea entende por “liberalidade sexual”.

Embora presente entre clérigos católicos da Idade Medieval, é com a Igreja Católica Apostólica Romana que os primeiros embates em torno do homossexualismo ganham forma e dimensão. Durante todo o período da Inquisição, e particularmente em Portugal, os conflitos com homossexuais aumentam na medida em que o Santo Ofício determina penas severas aos praticantes da livre opção sexual, como morte por fogueira. Um sermão proferido por ocasião de um Auto de Fé em Lisboa, em 1645, exemplifica o clima de embate entre católicos e homossexuais. “O crime de sodomia é gravíssimo e tão contagioso que em breve tempo infecciona não somente casas, lugares, vilas e cidades, mas ainda reinos inteiros! Sodoma quer dizer traição. Gomorra, rebelião. É tão contagiosa e perigosa a peste da sodomia que haver nela compaixão é delito”.

Na segunda metade do século XX, em Nova York, ocorre o que ficou conhecido como “Rebelião de Stonewall”. Reunidos no “Stonewall Bar”, em 28 de junho de 1969, cerca 400 gays desencadearam um movimento de rebelião contra a polícia nova-iorquina, com base na alegação de que eram constantemente “vítimas” de maus tratos e extorsões, por parte da polícia. A rebelião serviu de base para o início do que o movimento LGBT chama de “celebração do orgulho gay”, como também passou a ser utilizada como base de sustentação dos atuais movimentos de defesa dos direitos gays, havendo desdobramentos em inúmeros outros países, sendo o continente europeu a principal área de atuação dos ativistas, e a partir de onde várias organizações passaram a influenciar de forma decisiva outras regiões do planeta, a exemplo da América Latina. No Brasil, como também no México e na Argentina, o movimento homossexual se articula no sentido de pressionar o Estado a promulgar leis em defesa da comunidade gay, sendo o casamento civil, o direito a herança e a adoção de crianças alguns dos pontos defendidos, além de uma tentativa de fazer punir qualquer forma de expressão contrária ao homossexualismo. Neste contexto, evangélicos e católicos tornam-se os alvos principais de campanhas e protestos.

O direito a expressão religiosa, garantida pelas Constituições de 1891 e 1989, por exemplo, concede às entidades religiosas total liberdade para exporem opiniões e doutrinarem seus membros ou adeptos de acordo com suas normas de conduta e crença internas, o que inclui a questão da constituição familiar. A defesa, feita por igrejas evangélicas, de que homossexuais podem ser tratados e recuperados, é um direito constitucional, do qual o movimento LGBT não pode se levantar. Não há como equiparar, por exemplo, a critica a prática homossexual com os crimes de ordem racial. São casos distintos. Desde que entendida como opção de vida, de natureza psicológica ou social, o homossexualismo é passível de enfrentamento e recuperação. Ao mesmo tempo, as igrejas evangélicas têm o total direito de se oporem a influência de lideranças gays em assuntos do governo, como a educação sexual infantil, além de outros temas não diretamente ligados a questão homossexual, mas que interferem na ordem social.

A que se ressaltar, no entanto, que os direitos fundamentais do ser humano devem ser respeitados, mesmo diante de disparidades de ordem social ou religiosa. A crítica tem de ser baseada na prática, e não no praticante. Qualquer tipo de agressão ou incentivo à agressão deve ser punido na forma da lei. Tem-se que, ao mesmo tempo, respeitar os limites entre Estado e Igreja, bem como entre entidades representativas e o governo. Por mais justa e constitucionalmente correta, o enfrentamento da prática homossexual tem de ser feita internamente, voltada para a valorização dos princípios defendidos pela entidade religiosa, e jamais de forma estadualizada, porque poderia incorrer em algo próximo aos países teocráticos. Também não compete ao Estado financiar projetos ou materiais que fazem apologia ao homossexualismo. A defesa de minorias étnicas é uma questão totalmente diferente do uso do aparelho público para a defesa do homossexualismo.


Johnny Bernardo

é pesquisador, jornalista, escritor, colaborador da revista Apologética Cristã, do jornal norteamericano The Christian Post, do NAPEC (Núcleo Apologético Cristão de Pesquisas), palestrante e fundador do INPR Brasil (Instituto de Pesquisas Religiosas). Há mais de dez anos dedica-se ao estudo de religiões e crenças, sendo um dos campos de atuação a religiosidade brasileira e movimentos destrutivos.

É também o autor da matéria “Igreja Dividida, as fragmentações do Catolicismo Romano”, publicada no final de 2010 pela Revista Apologética Cristã (M.A.S Editora). Assina também a coluna Giro da Fé da referida revista.

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ceirbrasil@yahoo.com.br
pesquisasreligiosas@gmail.com



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A fé adaptada ao meio

Trazidos da África para substituírem os índios no trabalho de mão de obra escrava, os negros que aqui chegaram tiveram de se adaptar à religião dos senhores escravistas, temerosos pelas constantes punições decorrentes do Tribunal da Inquisição. Em todo o país, mas particularmente na Bahia, os negros adoradores dos orixás se viram obrigados a adaptarem suas crenças e nomenclaturas às crenças e santos católicos. O sincretismo religioso foi a saída encontrada para a manutenção de suas comunidades e devoção religiosa – cada um dos 16 orixás cultuados pelos africanos de origem iorubá ganharam correspondentes no Catolicismo Romano. Dessa forma, Ogum, tido como orixá guerreiro, é associado a São Jorge, e Iansã, deusa dos ventos, a Santa Bárbara.

Tal sincretismo religioso – já antes verificável nos primórdios da Igreja Católica, em Roma e a partir de 385 d.C.– se deu no campo das crenças, da transposição de liturgias e de ídolos pagãos. Atualmente, no entanto, um novo tipo de transposição vem ocorrendo particularmente nos países de maioria cristã. A busca por aceitação social, comodidade, compatibilidade etc. vem norteando o surgimento de novas igrejas (inclusivas?) e tendências dentro de denominações protestantes e também católicas. São praticamente os mesmos objetivos dos negros africanos e dos pagãos europeus do período da conversão compulsiva, mas com uma variante: o foco hoje é o adaptar da fé a um estilo de vida, de opção sexual e de consumo. A ordem natural – pregada pela maioria das igrejas cristãs – é de que o meio tem de se adaptar a fé e não o inverso.

Vivemos um período de pós-modernidade, de contestação ao modelo tradicional de família, de conduta social. Progressistas e outros mais sugerem um novo modelo de sociedade, caracterizada por uma crescente liberalidade sexual, de opinião e quebra de outros valores tidos como fundamentais da humanidade. Há uma preocupação, contextualizada pela eleição do novo papa, quanto à preservação dos valores morais e a integração dos grupos sociais ao sagrado. O homossexualismo é um dos focos de preocupação, por conta da tentativa de aceitabilidade social. Para tal aceitabilidade social – acreditam alguns grupos de homossexuais -, o casamento cível, a adoção de crianças e o desenvolvimento de uma prática religiosa qualquer são elementos vitais. Há, portanto, uma tentativa de enquadramento da sociedade ao seu estilo de vida.

Neste contexto, a religião também deve ser adaptada, mesmo com uns poucos arranjos doutrinários. As igrejas inclusivas – das quais a Igreja da Comunidade Metropolitana, a Igreja Cristã Contemporânea e a Comunidade Cristã Refúgio destacam-se no cenário religioso brasileiro – propõem a inserção de homossexuais no universo evangélico, citando a Bíblia como “favorável” ao homossexualismo. A tentativa de adaptação da fé ao meio é nítida com a publicação, por Gladstone, do livro A Bíblia sem preconceito. Fundador da Igreja Cristã Metropolitana (2006), o carioca Marcos Gladstone acredita ser o homossexualismo uma prática natural e diz ter como principal objetivo auxiliar homossexuais vitimas de preconceito em igrejas evangélicas.

Embora diferente, a adaptação da fé ao meio é uma prática cada vez mais comum em igrejas neopentecostais, a exemplo da Igreja Universal, da Renascer em Cristo, da Bola de Neve e da Sara Nossa Terra. Se na Igreja Universal há uma tentativa de adaptação da fé ao estilo de vida consumista de seus fieis, na Renascer, na Bola de Neve e na Sara Nossa Terra há uma estratégia no sentido de acomodação de seus membros, com a reencenação do estilo de vida secular. Dessa maneira, o púlpito ganha a forma de uma prancha de surfe, a igreja é usada como pista de dança, de lutas de MMA e disputas de skate. Há uma tentativa de adaptação da fé ao meio, uma espécie de contextualização da mensagem bíblica com foco em grupos específicos, como surfistas, skatistas, fankeiros etc. A estratégia é vista com preocupação por outras denominações evangélicas, que veem no modelo uma distorção da liturgia bíblica e uma superficialidade da vivência cristã.


Johnny Bernardo

é pesquisador, jornalista, escritor, colaborador da revista Apologética Cristã, do jornal norteamericano The Christian Post, do NAPEC (Núcleo Apologético Cristão de Pesquisas), palestrante e fundador do INPR Brasil (Instituto de Pesquisas Religiosas). Há mais de dez anos dedica-se ao estudo de religiões e crenças, sendo um dos campos de atuação a religiosidade brasileira e movimentos destrutivos.

É também o autor da matéria “Igreja Dividida, as fragmentações do Catolicismo Romano”, publicada no final de 2010 pela Revista Apologética Cristã (M.A.S Editora). Assina também a coluna Giro da Fé da referida revista.


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A Teoria do Cavalo de Troia

Por Homero (séc. VIII), ficamos sabendo que a Guerra de Troia foi um grande conflito entre gregos e troianos, ocasionado pelo rapto da princesa Helena – esposa do rei espartano Menelau. Passados dez anos de intensos combates – que ocasionou a morte, de ambos os lados, de centenas de soldados e “heróis” de guerra -, Odisseu concebeu uma estratégia que poria fim aos conflitos: os soldados deveriam deixar o campo de batalha e embarcarem em seus navios, deixando em terra um gigantesco cavalo de madeira. Encontrado, foi levado para dentro dos muros da cidade para ser exibido ao público. À noite, enquanto os troianos dormiam, soldados gregos saíram do interior do cavalo para abrir os portões da cidade, permitindo a entrada de centenas de guerreiros, os quais subjugaram seus inimigos.

Desenvolvido pelos gregos como uma forma de estratégia para a derrota dos troianos, o Cavalo de Troia passou à história como um modelo de infiltração e dissimulação, desde então usado por governos e grandes corporações na tentativa de subjugar psicologicamente civis e consumidores. Marketeiros (políticos e comerciais) dedicam-se, hoje, a criação de figuras emblemáticas a partir do nada, transformando perdedores em vencedores e vencedores em perdedores. Segundo Braick, Patricia Ramos, Mota e Myriam Becho, autores de História, das Cavernas ao Terceiro Milênio (Moderna, 1998, p.101), a “manipulação do imaginário social, para a construção da imagem daquele que irá ocupar o poder, é particularmente importante”. Citando teorias filosóficas que auxiliaram reis durante o absolutismo monárquico, os autores concluem que “esses pensadores fizeram mais do que vender a imagem da realeza”.

A teoria do Cavalo de Troia é igualmente usada por movimentos destrutivos, a exemplo das diversas seitas norte-americanas que manipulam seus seguidores ao exigir total rompimento com familiares, amigos e relacionamentos amorosos como forma de dedicação à nova fé – à fé comunitária e isolacionista. O engodo, neste caso, é a ideia de que o líder religioso possui condições e conhecimentos necessários para livrar seus seguidores do mal, do inimigo que solapa a humanidade. É comum a veiculação de teorias conspiratórias, de mensagens do além sobre um possível despertar ou desfecho dos séculos, causado por um grande cataclisma mundial. Há sempre um inimigo a ser combatido, seja ele espiritual ou material. Jim Jones, para escapar da influência do governo dos EUA e continuar a explorar seus seguidores, transferiu sua organização religiosa para uma colônia agrícola de Jonestown, na Guiana Inglesa, onde liderou o maior suicídio em massa da História, quando 913 pessoas morreram vítimas de envenenamento.

Da Coreia do Sul para os EUA, o reverendo Sun Myung Moon (1920-2012) foi o responsável pela organização da maior e mais bem organizada seita destrutiva em atividade no mundo. Fundada em 1954, a Igreja da Unificação diz ter como principal missão recrutar jovens dinâmicos e do tipo mochileiros para participarem da construção do reino de Deus na Terra, missão está reivindicada por Moon. Segundo o jornalista francês Jean-François Boyer, autor de O Império Moon, os bastidores de uma seita impiedosa (Editora Globo, 1988, p. 27), “para acolher os candidatos nas melhores condições psicológicas possíveis – na calma, longe da família, dos amigos e tentações -, a igreja necessita de casas afastadas, espaçosas e, se possível, atraentes. Isso explica o porquê de o Movimento possuir em todo o mundo e em tão pouco tempo um rico patrimônio imobiliário”. Concluindo, Boyer declara que uma das fórmulas criadas pelo reverendo Moon para recepcionar novos candidatos, é “bombardeá-los com amor”. E eles o são!

Apesar de fundador e principal líder da Igreja da Unificação, Moon teve o auxilio de Yong Oon Kim, professora na Universidade cristã de Ewha, em Seul, onde, à época, lecionava Novo Testamento e religiões comparadas. Após contato com os ensinos de Sun Myung Moon – inicialmente com objetivos profissionais, de investigação -, Kim adere ao movimento, sendo a responsável pela aproximação da pequena comunidade com a alta burguesia coreana, elevando-a a novos patamares. É com o general Bo Hi Pak e seus recrutas que a Igreja da Unificação assumiria sua principal característica – a de oposição ao comunismo. Defensores da pátria e ferrenhos opositores ao comunismo, o grupo liderado pelo general Pak serviu de inspiração ao reverendo Moon. “Compreende também que ninguém pode se tornar influente na Coreia sem aparecer como um líder anticomunista confiável e eficaz” (O Império Moon, p. 125). Convertidos, Pak e seus recrutas deram novo sentido à Igreja da Unificação, fazendo dela uma potência mundial.

No Brasil, a Igreja Universal do Reino de Deus (1977) incorporaria parte das estratégias adotadas pela Igreja da Unificação, como investimento maciço em meios de comunicação, influência política e social, e o combate às religiões afro-brasileiras e o catolicismo romano como sua bandeira principal. Na guerra por consumidores de seus produtos e soluções mágico-espiritualistas, o senso de ética perde o sentido. Não há mais respeito à vida; no lugar, o aborto é reivindicado como elemento de disputa por fieis. De forma semelhante, a Igreja da Unificação – apesar de hastear a bandeira de promotora da paz no mundo – financia e aparelha guerrilhas da América Latina e África. São mecanismos de infiltração, de dissimulação de suas reais intenções na sociedade.


Johnny Bernardo

é pesquisador, jornalista, escritor, colaborador da revista Apologética Cristã, do jornal norteamericano The Christian Post, do NAPEC (Núcleo Apologético Cristão de Pesquisas), palestrante e fundador do INPR Brasil (Instituto de Pesquisas Religiosas). Há mais de dez anos dedica-se ao estudo de religiões e crenças, sendo um dos campos de atuação a religiosidade brasileira e movimentos destrutivos.

É também o autor da matéria “Igreja Dividida, as fragmentações do Catolicismo Romano”, publicada no final de 2010 pela Revista Apologética Cristã (M.A.S Editora). Assina também a coluna Giro da Fé da referida revista.

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