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A Teoria do Cavalo de Troia

Por Homero (séc. VIII), ficamos sabendo que a Guerra de Troia foi um grande conflito entre gregos e troianos, ocasionado pelo rapto da princesa Helena – esposa do rei espartano Menelau. Passados dez anos de intensos combates – que ocasionou a morte, de ambos os lados, de centenas de soldados e “heróis” de guerra -, Odisseu concebeu uma estratégia que poria fim aos conflitos: os soldados deveriam deixar o campo de batalha e embarcarem em seus navios, deixando em terra um gigantesco cavalo de madeira. Encontrado, foi levado para dentro dos muros da cidade para ser exibido ao público. À noite, enquanto os troianos dormiam, soldados gregos saíram do interior do cavalo para abrir os portões da cidade, permitindo a entrada de centenas de guerreiros, os quais subjugaram seus inimigos.

Desenvolvido pelos gregos como uma forma de estratégia para a derrota dos troianos, o Cavalo de Troia passou à história como um modelo de infiltração e dissimulação, desde então usado por governos e grandes corporações na tentativa de subjugar psicologicamente civis e consumidores. Marketeiros (políticos e comerciais) dedicam-se, hoje, a criação de figuras emblemáticas a partir do nada, transformando perdedores em vencedores e vencedores em perdedores. Segundo Braick, Patricia Ramos, Mota e Myriam Becho, autores de História, das Cavernas ao Terceiro Milênio (Moderna, 1998, p.101), a “manipulação do imaginário social, para a construção da imagem daquele que irá ocupar o poder, é particularmente importante”. Citando teorias filosóficas que auxiliaram reis durante o absolutismo monárquico, os autores concluem que “esses pensadores fizeram mais do que vender a imagem da realeza”.

A teoria do Cavalo de Troia é igualmente usada por movimentos destrutivos, a exemplo das diversas seitas norte-americanas que manipulam seus seguidores ao exigir total rompimento com familiares, amigos e relacionamentos amorosos como forma de dedicação à nova fé – à fé comunitária e isolacionista. O engodo, neste caso, é a ideia de que o líder religioso possui condições e conhecimentos necessários para livrar seus seguidores do mal, do inimigo que solapa a humanidade. É comum a veiculação de teorias conspiratórias, de mensagens do além sobre um possível despertar ou desfecho dos séculos, causado por um grande cataclisma mundial. Há sempre um inimigo a ser combatido, seja ele espiritual ou material. Jim Jones, para escapar da influência do governo dos EUA e continuar a explorar seus seguidores, transferiu sua organização religiosa para uma colônia agrícola de Jonestown, na Guiana Inglesa, onde liderou o maior suicídio em massa da História, quando 913 pessoas morreram vítimas de envenenamento.

Da Coreia do Sul para os EUA, o reverendo Sun Myung Moon (1920-2012) foi o responsável pela organização da maior e mais bem organizada seita destrutiva em atividade no mundo. Fundada em 1954, a Igreja da Unificação diz ter como principal missão recrutar jovens dinâmicos e do tipo mochileiros para participarem da construção do reino de Deus na Terra, missão está reivindicada por Moon. Segundo o jornalista francês Jean-François Boyer, autor de O Império Moon, os bastidores de uma seita impiedosa (Editora Globo, 1988, p. 27), “para acolher os candidatos nas melhores condições psicológicas possíveis – na calma, longe da família, dos amigos e tentações -, a igreja necessita de casas afastadas, espaçosas e, se possível, atraentes. Isso explica o porquê de o Movimento possuir em todo o mundo e em tão pouco tempo um rico patrimônio imobiliário”. Concluindo, Boyer declara que uma das fórmulas criadas pelo reverendo Moon para recepcionar novos candidatos, é “bombardeá-los com amor”. E eles o são!

Apesar de fundador e principal líder da Igreja da Unificação, Moon teve o auxilio de Yong Oon Kim, professora na Universidade cristã de Ewha, em Seul, onde, à época, lecionava Novo Testamento e religiões comparadas. Após contato com os ensinos de Sun Myung Moon – inicialmente com objetivos profissionais, de investigação -, Kim adere ao movimento, sendo a responsável pela aproximação da pequena comunidade com a alta burguesia coreana, elevando-a a novos patamares. É com o general Bo Hi Pak e seus recrutas que a Igreja da Unificação assumiria sua principal característica – a de oposição ao comunismo. Defensores da pátria e ferrenhos opositores ao comunismo, o grupo liderado pelo general Pak serviu de inspiração ao reverendo Moon. “Compreende também que ninguém pode se tornar influente na Coreia sem aparecer como um líder anticomunista confiável e eficaz” (O Império Moon, p. 125). Convertidos, Pak e seus recrutas deram novo sentido à Igreja da Unificação, fazendo dela uma potência mundial.

No Brasil, a Igreja Universal do Reino de Deus (1977) incorporaria parte das estratégias adotadas pela Igreja da Unificação, como investimento maciço em meios de comunicação, influência política e social, e o combate às religiões afro-brasileiras e o catolicismo romano como sua bandeira principal. Na guerra por consumidores de seus produtos e soluções mágico-espiritualistas, o senso de ética perde o sentido. Não há mais respeito à vida; no lugar, o aborto é reivindicado como elemento de disputa por fieis. De forma semelhante, a Igreja da Unificação – apesar de hastear a bandeira de promotora da paz no mundo – financia e aparelha guerrilhas da América Latina e África. São mecanismos de infiltração, de dissimulação de suas reais intenções na sociedade.


Johnny Bernardo

é pesquisador, jornalista, escritor, colaborador da revista Apologética Cristã, do jornal norteamericano The Christian Post, do NAPEC (Núcleo Apologético Cristão de Pesquisas), palestrante e fundador do INPR Brasil (Instituto de Pesquisas Religiosas). Há mais de dez anos dedica-se ao estudo de religiões e crenças, sendo um dos campos de atuação a religiosidade brasileira e movimentos destrutivos.

É também o autor da matéria “Igreja Dividida, as fragmentações do Catolicismo Romano”, publicada no final de 2010 pela Revista Apologética Cristã (M.A.S Editora). Assina também a coluna Giro da Fé da referida revista.

Contato

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